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GUERRA CONTRA PATENTES

17/05/2005 - cORREIO BRAZILIENSE

Humberto Costa ameaça indústria farmacêutica

Humberto Costa ameaça, na Suíça, suspender as conversas com a indústria farmacêutica para a produção de medicamentos anti-Aids

O ministro da Saúde, Humberto Costa, ameaça encerrar as negociações com as empresas farmacêuticas. Ele lança hoje, em Genebra, na Suíça, um alerta à comunidade internacional, em discurso na Assembléia Mundial da Saúde, sobre a disposição de estabelecer licenças compulsórias para a produção de medicamentos do coquetel contra a Aids, caso não haja acordo nos próximos dias entre o governo brasileiro e os laboratórios farmacêuticos.
“Respeitamos as patentes, mas entendemos que o nosso programa pode perder sustentabilidade no futuro”, afirmou o ministro. “Há, portanto, uma grande possibilidade de que Brasil use todas as flexibilidades do acordo de patentes, terminando o processo de negociações com as empresas”. Costa tenta montar, com o apoio internacional, uma blindagem contra a pressão do setor privado e dos países ricos.
As negociações com as três companhias estrangeiras foram iniciadas em março. O governo brasileiro estipulou o final de abril como o prazo de conclusão da negociação. A idéia era que as empresas dessem uma licença voluntária para a produção dos remédios lopinavir/ritonavir, tenofovir e efavirenz no Brasil. Sem acordo, o governo decretaria a quebra das patentes. O Brasil se recusa a mencionar os nomes das empresas, mas entidades não-governamentais apontam a Abbott e a Merck.
“O mundo inteiro aguarda essa definição por parte do Brasil. Será um passo simbólico, seja em um caso de um acordo com as empresas, seja a quebra das patentes”, disse um negociador em Genebra à Agência Estado, que pediu para não ser identificado. Segundo esse negociador, vários governos em desenvolvimento e mesmo a Organização Mundial da Saúde (OMS) acompanham cada passo das negociações.
Para o ministro, que ainda aposta em uma saída negociada com as empresas, o problema tem sido o incremento nos gastos do governo com os remédios importados. Do orçamento para a compra de antiretrovirais 66% são gastos com esses três remédios importados e que estão sob patente. Segundo Humberto Costa, o orçamento do ministério passou de R$ 550 milhões para R$ 916 milhões a fim de cumprir suas obrigações na distribuição coquetel anti-Aids. “Os novos produtos no mercado são cada vez mais caros. Portanto, vamos anunciar à Assembléia Mundial da Saúde nossa disposição em produzir novos remédios antiretrovirais e que pedem a concessão de licenças voluntárias”, explicou Costa.
O ministro conversa hoje com países em desenvolvimento e com o diretor da Unaids, Peter Piot, para alertar que a quebra de patentes poderá ocorrer. A idéia é conseguir apoio político do maior número possível de atores relevantes no cenário internacional para resistir às pressões das indústrias e dos países ricos.
Apesar das intenções do governo de usar as flexibilidades dos acordos de patentes para produzir os medicamentos no país, as autoridades admitem que as empresas no Brasil não estão investindo suficientemente em pesquisa. Segundo Paulo Buss, presidente da Fundação Oswaldo Cruz, uma linha de crédito do BNDES foi aberta em junho do ano passado para empresas que quisessem investir. Até hoje, apenas 10% dos US$ 100 milhões colocados à disposição foram usados pelas empresas. “As empresas estão sendo pouco solidárias e todo o investimento nesse momento está sendo feito pelo governo”, afirmou Buss.