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Vacina terapêutica contra o HIV

14/07/2003 - FONTE - LE MONDE

apresenta resultados "animadores"

Entre os pacientes vacinados, 25% puderam interromper sem problema o seu tratamento por multiterapia, segundo os resultados de testes realizados em 118 pessoas.


Paul Benkimoun


A utilização de uma vacina terapêutica contra o vírus da Aids (HIV) permite a indução, pela primeira vez, de uma resposta do sistema do organismo em pacientes socropositivos, afirmam os responsáveis de dois estudos franceses que foram apresentados nesta quarta-feira (12), por ocasião da 10ª conferência sobre os retrovírus e as infecções oportunistas (CROI), em Boston (EUA). Implementados pela Agência Nacional de Pesquisas sobre a Aids (ANRS), estes dois estudos testaram a eficiência de uma vacina terapêutica contra a infecção por HIV.

"Com estes resultados preliminares, conseguimos comprovar, pela primeira vez, o interesse e a eficiência desse conceito. Eles nos incentivam a prosseguir nesse caminho de pesquisa", explicou a investigadora principal de um desses estudos, a professora Christine Katlama, do hospital La Pitié-La Salpêtrière de Paris. Essa estratégia consiste em administrar vacinas contra o HIV a pacientes já infectados, de maneira a estimular o seu sistema imunológico contra o vírus.

O objetivo desta terapia por meio de vacina é obter um melhor controle da replicação viral, permitindo eventualmente efetuar uma interrupção temporária do tratamento tradicional. Atualmente, a terapia por meio de vacina vem sendo objeto de "três ou quatro" estudos em todo o mundo e de uma teste clínico internacional. Os primeiros resultados deverão ser anunciados em meados de 2003, conforme indicou o professor Jean-François Delfraissy, que dirige o grupo de "testes terapêuticos" da ANRS.

"Os pacientes diagnosticados com HIV positivo mostram-se particularmente atentos para os resultados da terapia por meio de vacina, que poderia lhes permitir interromper temporariamente os seus tratamentos com antiretrovirais. Eles estão cansados desses tratamentos, em razão dos seus efeitos secundários por demais pesados", sublinhou, por sua vez, Emmanuel Trenado, do interassociativo TRT-5.

O primeiro estudo piloto, batizado Vacciter, foi conduzido junto a 48 pacientes diagnosticados com HIV positivo, todos já submetidos à multiterapia antiretroviral, afetados por uma carga viral não-detectável inferior a 200 cópias por mililitro e por CD4 superiores a 400 por milímetro cúbico (mm3) há pelo menos um ano. Todos os participantes receberam quatro injeções, a intervalos de um mês, da vacina Alvac, produzida por Aventis Pasteur e composta do vírus canarypox. Essa vacina é dotada dos genes codificando duas proteínas do HIV, nef e pol. Um mês após a última injeção da vacina, os pacientes interromperam o seu tratamento antiretroviral.

Reposta máxima após duas injeções

"Uma resposta imunológica específica do CD4 dirigida contra o HIV foi observada em 61% dos pacientes no decorrer da fase de vacinação. Também registramos em 55% dentre eles uma indução da resposta imunológica citotóxica CD8", indicou a investigadora desse estudo, Christine Katlama. Segundo ela, a indução da resposta imunológica é ao mesmo tempo qualitativa e quantitativa, uma vez que uma ampliação da quantidade e da capacidade das células CD8 citotóxicas foi constatada.

Contudo, após a suspensão do tratamento "tradicional", 80% dos pacientes tiveram que retomá-lo, dentro de um prazo médio de 6,6 semanas. "No momento da análise dos dados, dez pacientes continuavam a não precisar de tratamento, sendo que a sua carga viral permanecia inferior a 10 mil cópias", explicou Christine Katlama. O período antes da retomada da multiterapia foi significativamente mais longo entre os pacientes que apresentavam uma resposta imunológica no momento da interrupção do tratamento, em relação aos pacientes sem resposta imunológica, sendo de 9,7 semanas para os primeiros e de 6,3 semanas para os outros.

Assim, após 20 semanas de interrupção, os autores dos estudos não registraram nenhum efeito clínico indesejável e nenhuma toxicidade biológica, e ainda notaram que a intensidade máxima da resposta imunológica ocorreu após duas injeções da vacina. "Tudo indica que esgotamos a dinâmica com a quarta vacinação uma vez que a resposta máxima foi obtida após duas injeções. Além disso, ao injetar uma quantidade excessiva da vacina, acabamos diminuindo a eficiência do sistema imunológico", explicou a professora Katlama, que propõe fazer uma reavaliação da programação da administração da vacina durante o teste.



"Para os próximos testes com vacina, poderíamos tentar, numa primeira fase, fazer uma ou duas injeções, e então esperar um certo tempo antes de reinjetar a vacina", sugere Brigitte Autran, a coordenadora dos testes com vacina implementados pela ANRS.

Estudo comparativo

Por ocasião do congresso CROI, os pesquisadores franceses também apresentaram um outro estudo (Vaccil-2) no qual foi testada a eficiência da terapia por meio de vacina, desta vez por meio de um teste comparativo junto a 70 pacientes diagnosticados com HIV positivo, e utilizando a mesma vacina que no estudo precedente. Também neste caso, os pacientes soropositivos recrutados para este estudo vinham sendo submetidos a um tratamento por multiterapia há mais de um ano.

A metade entre eles prosseguiu sem modificação o seu tratamento antiretroviral, enquanto os outros receberam, além deste tratamento, quatro injeções da vacina Alvac, em intervalos de um mês, e, posteriormente, receberam ainda três tratamentos com interleukine-2.

Após neve meses de tratamento, 91% dos pacientes estudados suspenderam os seus remédios antiretrovirais. Após três meses de interrupção de tratamento, oito dos pacientes vacinados (24%) continuavam sem tratamento. Além disso, dois pacientes do primeiro grupo sob controle (5%) encontravam-se na mesma situação.

Sublinhando que este estudo mostrava pela primeira vez a capacidade da terapia por meio de vacina de induzir uma resposta imunológica, o professor Lévy explicou que a vacina permitiu "reeducar o sistema imunológico, aumentando as chances de controlar o vírus". Neste caso, o sistema imunológico seria um "antiretroviral" eficiente.