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TRANSMISSÃO DO HIV DA MÃE PARA O FILHO

21/09/2009 - G1 - Globo.Com

Prevenção da transmissão de HIV de mãe para filho é falha no país

Prevenção da transmissão de HIV de mãe para filho é falha no país, diz Ensp

Pesquisa avalia projeto do Ministério da Saúde como "insatisfatório".
Em 33% das maternidades não havia teste rápido para aids.

O programa que deveria ser a garantia de proteção dos recém-nascidos no Brasil contra a transmissão vertical (da mãe para o filho) do vírus HIV não funciona como deveria. Duas recentes pesquisas realizadas em maternidades onde o projeto Nascer-Maternidades, do Ministério da Saúde, foi implantado revelam que seu funcionamento está longe do ideal.

O primeiro estudo, concluído em 2008, foi realizado pela Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp) em trinta maternidades de todo o país. O segundo examinou quatro centros hospitalares pernambucanos e foi conduzido pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Ambos têm a mesma conclusão: o grau de implementação do programa nesses locais é “insatisfatório”.

O projeto foi criado em 2002, pelo Departamento Nacional de DST/Aids, ligado ao ministério, para reduzir a incidência de transmissão vertical do vírus HIV e da sífilis congênita. Fazem parte 570 maternidades em todo o país.

As maternidades incluídas no programa passaram a adotar um protocolo de procedimentos que inclui a utilização de testes rápidos para o HIV, tratamento para as gestantes e para as crianças expostas.
De acordo com o levantamento da Ensp, das 30 maternidades investigadas 67% tinham kits disponíveis para a realização do teste rápido e o medicamento AZT. Entre as gestantes que não fizeram o teste durante o pré-natal, apenas 28% passaram pelo exame no momento do parto. “É um número que consideramos baixo. Pode ter sido uma perda muito grande para as mulheres que passaram pela maternidade”, afirma a sanitarista Ana Cristina Reis, autora do estudo.

A pesquisa identificou 324 gestantes soropositivas. Dessas, 18% não foram medicadas com AZT. Desde 1996, o Sistema Único de Saúde (SUS) fornece gratuitamente o medicamento para as gestantes portadoras do vírus da aids. Entre os recém-nascidos, 7% dos expostos não foram medicados com AZT e apenas 52% deles receberam a fórmula infantil, o substituto para o leite materno.

O leite materno é uma das formas de transmissão do HIV e a pesquisadora explica que o resultado não explicita qual alimento foi introduzido em seu lugar para 48% dos recém-nascidos. No entanto, não descarta que o aleitamento tenha sido levado adiante. “A avaliação foi solicitada pelo Departamento de DST/Aids para verificamos como o controle está sendo feito pelas maternidades e a forma como as atividades vem sendo desenvolvidas não atendem as normas de boas práticas”, diz Ana Cristina.

Segundo Marcelo Freitas, assessor técnico do Departamento de DST/Aids, o projeto Nascer foi a primeira tentativa do ministério para a redução da transmissão vertical. Ele explica que após sete anos, outras maternidades recebem os kits para os testes mesmo sem fazer parte do programa. “Hoje o cenário é diferente, temos mais de mil maternidades que recebem o teste rápido, aumentamos muito a cobertura”, afirma. “Não temos demanda reprimida, os kits são enviados para todas as maternidades que solicitam.”

Pernambuco

Apesar de restrito a quatro maternidades de Pernambuco, o estudo da UFPE reflete a mesma realidade encontrada pela Ensp. As cidades escolhidas foram Vitória de Santo Antão, Caruaru, Garanhuns e Petrolina. A escolha, explica Vilma Costa de Macêdo, autora do estudo, se deu em função da interiorização dos casos de aids. “As últimas pesquisas mostram que hoje a doença tem maior tendência de crescimento no interior do que nas capitais”, afirma.

Nas maternidades de Vitória de Santo Antão e Caruaru, o programa foi considerado “parcialmente implantado” e em Garanhuns e Petrolina, os serviços foram classificados como “insatisfatórios”. Para a pesquisadora, além da falta de insumos básicos para o funcionamento do projeto, a falta de qualificação da mão de obra e a organização também são obstáculos. “Muitas vezes, a mulher é enviada para a sala de parto sem fazer o teste. O resultado é que os 90% de chance que o bebê tinha de nascer sem o vírus se perde”, diz Vilma.

Segundo ela, a falta de estrutura se reflete na organização do sistema. “Às vezes, o diretor recebe verbas do programa e nem sabe o que é. Isso é resultado da rotatividade dos gestores no Sistema Único de Saúde (SUS)”, afirma.

Para o coordenador do programa estadual de DST/Aids e Hepatites Virais de Pernambuco, François Figueiroa, a diferença entre as maternidades do estado precisa ser considerada na análise dos resultados. O programa do ministério está presente em 66 das mais de 150 maternidades do estado. “Não podemos achar que o programa vai acontecer de forma igual em todas as unidades. Temos problemas como mudanças de gestão e mudanças de equipe e essas variáveis influenciam o desempenho não só desse projeto como de qualquer outro”, diz.

No entanto, o coordenador afirma que o estado avançou no combate à transmissão vertical do HIV. “Nos últimos dois anos, por exemplo, não temos mais problemas com o teste rápido”, diz.