PLANEJAMENTO PARA OS TESTES DE VACINAS CONTRA HIV
Dossiê Vacinas - Número 01 - Abril de 1992
José Esparza, Saladin Osmanov, Lars O. Kallings e Wigzell - Sociólogo e presidente da ABIA - Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS

A Perspectiva da OMS

Introdução

Tem sido apenas parcial o sucesso de diversas estratégias de intervenção para conter a propagação da epidemia de HIV/AIDS, no que se refere à redução do comportamento de risco. Apesar dos intensos esforços nacionais e internacionais, estima-se em 10 milhões de adultos e um milhão de crianças o total de pessoas infectadas pelo vírus em todo mundo [1]. A prevalência de HIV continua crescendo em todo o mundo. Segundo projeção da Organização Mundial de Saúde (OMS), haverá até o ano 2000, um total acumulado de 40 milhões de infecções por HIV entre homens, mulheres e crianças, e mais de 90% dessas infecções terão ocorrido em países em desenvolvimento e mais de 80% dessas terão sido a conseqüência de contato heterossexual [2].
A disponibilidade de uma vacina segura eficaz contra HIV seria de enorme valia para complementar outras intervenções de prevenção e para atingir populações que poderiam não ser facilmente acessíveis àquelas intervenções. Diversas vacinas candidatas estão sendo atualmente submetidas às primeiras provas clínicas humanas e muitas outras estão sendo desenvolvidas no laboratório [3]. Essas primeiras provas clínicas (por vezes denominadas provas da Fase I/II) estão proporcionando valiosas informações sobre a segurança e imunogenicidade das vacinas candidatas, assim como dos aspectos logísticos e práticos da testagem de vacinas contra o HIV [4]. Algumas dessas vacinas candidatas podem no futuro passar às provas da Fase III, que se destinam a avaliar a sua eficiência na proteção contra a infecção pelo HIV.
Embora a meta final do desenvolvimento da vacina contra o HIV seja a disponibilidade de vacina preventiva segura e eficaz para proteger indivíduos sadios soronegativos contra a infecção e/ou a doença, é também reconhecido o fato de que existem outros possíveis usos: como agente terapêutico (imunoterapia ativa) em indivíduos soropositivos, ou como vacina perinatal para impedir a transmissão do vírus de mãe infectada por HIV ao recém-nascido. Neste caso, a vacina poderia servir também de agente terapêutico na mãe, evitando ao mesmo tempo a infecção do feto. Do ponto de vista da saúde pública, uma vacina capaz de impedir a infecção pelo HIV é uma meta altamente desejável, pelo fato de que teria um efeito multiplicador a corrente de transmissão do vírus.
A complexidade dos futuros testes de eficácia da vacina anti-HIV é esmagadora. Terá sido necessário avaliar diversas vacinas candidatas, em países tanto desenvolvidos como em desenvolvimento, e os períodos de avaliação durarão muitos anos. Ademais, o aperfeiçoamento de vacinas contra o HIV será um processo contínuo. Ainda que a segurança e a eficácia de algumas vacinas candidatas iniciais seja demonstrada mediante provas nos próximos anos, é possível que os produtos não se prestem para uso em todas as partes do mundo. Muito provavelmente, o desenvolvimento de vacinas far-se-á em etapas sucessivas, devido a melhoramentos das formulações iniciais e ao desenvolvimento de novos vetores e/ou adjuvantes, o que, além de dar margem a uma eficácia maior, resultará também no decréscimo do número de doses necessárias, ampliando, segundo se espera, a extensão da proteção para um número maior de sujeitos e, com toda certeza, diminuindo o custo das vacinas.
O aperfeiçoamento e avaliação de vacinas candidatas contra o HIV colocam no tapete diversos desafios científicos, éticos, jurídicos e sociais, especialmente se as provas forem levadas a cabo em outros países que não aqueles que estão sendo desenvolvidas, isto é, num contexto internacional [5]. Para enfrentar esse desafio global, se faz necessária uma intensa colaboração internacional a longo prazo entre países, programas nacionais de desenvolvimento de vacinas anti-HIV, a indústria farmacêutica e biotecnológica e os organismos doadores, que eventualmente estarão envolvidos na provisão de vacinas aos países necessitados.

A Estratégia da OMS para Desenvolvimento de Vacinas Anti-HIV

A OMS recebeu o mandato de dirigir e coordenar a urgente luta global contra a SIDA/AIDS. Assessorada pelo recém-criado Comitê Coordenador do Aperfeiçoamento de Vacinas, o Programa Mundial de AIDS (PMA) da OMS formulou uma estratégia geral para a elaboração de vacinas contra o HIV. Essa estratégia tem três aspectos principais: desenvolvimento, avaliação e disponibilidade. As metas da estratégia até o fim da fase de desenvolvimento são: facilitar a colaboração internacional na pesquisa de vacinas, promover o aperfeiçoamento de vacinas apropriadas para uso em países em desenvolvimento e proporcionar mecanismos para identificar as vacinas candidatas que mereçam avaliação num contexto internacional. Durante a etapa de avaliação as metas são: identificar, avaliar e assegurar o fortalecimento dos possíveis locais de avaliação de vacinas em países em desenvolvimento, promover e apoiar a realização de provas de campo científica e eticamente bem fundamentadas (Fases I, II e III) de vacinas candidatas e assegurar a análise e avaliação adequadas dos resultados dessas provas. Até a fase de disponibilidade, e em preparação para o momento em que se disponha de vacinas seguras e eficazes, as metas serão concernentes à acessibilidade econômica e à distribuição, particularmente em países em desenvolvimento, e incluem estratégias para identificação de possíveis grupos alvos e mecanismos para fornecimento futuro de vacinas.
Tais atividades estão sendo levadas a cabo em estreito entrosamento com outros esforços nacionais e internacionais para o aperfeiçoamento de vacinas anti-HIV, inclusive os da indústria farmacêutica/biotecnológica [6].

Desenvolvimento e Identificação de Vacinas Candidatas Apropriadas para Testagem Internacional

Para que possam desempenhar papel significativo no controle futuro da epidemia de AIDS, é preciso que as vacinas sejam apropriadas para uso em populações com alto risco de infecção, em países tanto industrializados como em desenvolvimento. As vacinas preventivas devem ser antigenicamente apropriadas para dar proteção contra a infecção pelo HIV em todas as áreas geográficas do mundo e ser fáceis de administrar. Devem conferir imunidade duradoura contra vírus em estado livre e associados a células, com um número mínimo de doses; e devem ser termoestáveis. Devem impedir a transmissão por qualquer via, inclusive o sangue e a transmissão sexual, esta última, talvez, pela indução de imunidade tanto sistêmica como ao nível de mucosa. Neste particular, perde-se-ia explorar mais intensivamente a possibilidade de vacinas orais capazes de produzir imunidade ao nível da mucosa.
O conhecimento detalhado das características genéticas e antigenéticas das cepas de HIV prevalentes em diferentes áreas geográficas pode ser essencial para a compreensão da epidemiologia da infecção por ele causada e deve proporcionar uma base essencial para o enfoque racional do aperfeiçoamento de vacinas [7]. Para assegurar esse conhecimento, a OMS criou uma Rede [Mundial] para Isolamento e Caracterização do HIV, destinada a assegurar a disponibilidade de cepas apropriadas de vacinas precedentes de locais selecionados. A Rede está preparando protocolos padronizados para coleta, isolamento e caracterização básica de cepas de HIV [8], e cepas obtidas pela Rede da OMS serão postas gratuitamente à disposição de cientistas, pesquisadores e fabricantes de vacinas.
O Comitê Coordenador do Desenvolvimento de Vacinas da OMS/PMA está identificado critérios para admissão de vacinas candidatas a provas clínicas, especialmente em casos nos quais devem ser testadas em países em desenvolvimento. Diretrizes descrevendo esses critérios serão distribuídas aos países, estimulando-os a buscar o endosso da OMS para todos os testes de vacinas contra a AIDS. É recomendada também uma interação dos pesquisadores de vacinas com a OMS desde as etapas iniciais do processo de planejamento, assim como a apresentação de seus protocolos para revisão e apoio do Comitê Coordenador. A OMS prontificou-se a servir como facilitadora, a fim de assegurar a rápida implementação de estudos cientifica e eticamente aceitáveis de vacinas e está formando um mecanismo para a revisão dos protocolos de vacinas candidatas, inclusive as que são testadas em países em desenvolvimento. A OMS acompanha constantemente o progresso das vacinas em todo o mundo, a fim de poder recomendar a formulação dos estudos mais apropriados, com base na experiência adquirida com as etapas anteriores. Esse processo é estritamente confidencial e destina-se a possibilitar uma rápida tramitação dos conselhos, das recomendações e do endosso do Comitê Coordenador OMS/PMA para Desenvolvimento de Vacinas.
Os critérios para aceitação de uma vacina candidata podem variar, dependendo da finalidade da vacina candidata, seja esta preventiva, terapêutica ou perinatal. Nas diretrizes que estão sendo formuladas pelo Comitê de Coordenação, os seguintes aspectos gerais são considerados: a) fundamento racional da busca de proteção ou tratamento para a população ou tratamento para a população a ser estudada, inclusive a compatibilidade antigênica entre as cepas de HIV incluídas nas vacinas e as em circulação na população do estudo; b) avaliação prévia ou paralela de uma vacina comparável (ou seja, a mesma proteína de uma cepa diferente de HIV) no país de origem; e c) avaliação independente do controle de qualidade das vacinas pelas autoridades fiscalizadoras apropriadas no país de origem.

Preparação de Locais para Avaliação de Vacinas Contra o HIV

É amplamente reconhecido o fato de que poderia haver necessidade de muitos diferentes estudos da Fase I/II de vacinas candidatas contra o HIV para compreender importantes variáveis do aperfeiçoamento de vacinas, como, por exemplo os tipos de imunizantes e a melhor maneira de apresenta-los, e os correlatos imunes da proteção em relação a estudos em modelos animais. É também geralmente sabido que tais pesquisas, via de regra, devem ser feitas no país de origem da vacina candidata. As provas em grande escala da eficácia de vacinas candidatas cuidadosamente selecionadas (Fase III) devem ser, contudo, mais limitadas, realizando-se em populações com alta incidência de infecções pelo HIV, em países tanto desenvolvidos como em desenvolvimento.
É possível que determinada vacina candidata ofereça diferentes graus de proteção, conforme seja a população na qual é testada, dadas as diferenças quanto à via, aos padrões e à freqüência da transmissão. Assim, pode ser necessário testar dada vacina candidata em diferentes populações.
É geralmente reconhecida a necessidade de que os testes de segurança e imunogenicidade (Fase I/II) das vacinas candidatas testadas no país de origem sejam repetidos ou efetuados em forma paralela em países onde serão realizadas provas de eficácia, pelo fato de que as diferenças na resposta imunitária e nos efeitos colaterais podem variar devido a fatores tais como nutrição, infecções inaparentes e/ou diferenças genéticas na resposta imunitária. As provas repetidas ou paralelas da Fase I/II em países em desenvolvimento contribuirão também para o treinamento e o fortalecimento institucional, razão pala qual podem os cientistas daqueles países ter plena participação no processo científico de aperfeiçoamento de vacinas contra o HIV.
A OMS identificou possíveis locais para testes de eficácia de vacinas candidatas contra o HIV (preventivas, terapêuticas e/ou perinatais). Países da África, da América Latina e do Caribe foram visitados por equipes da OMS/PMA para avaliar o seu potencial para a testagem de vacinas contra o HIV. Os primeiros locais de prova foram selecionados pelo Comitê Coordenador do Desenvolvimento de Vacinas da OMS/PMA em setembro de 1991. Os critérios para seleção daqueles países compreenderam considerações epidemiológicas, laboratoriais, clínicas e operativas, que foram identificadas numa consulta da OMS em novembro de 1990 [9].
Os possíveis grupos alvo de população para provas de vacinas preventivas contra o HIV são aqueles nos quais se observa alta incidência de HIV e baixo potencial de desistência. Uma incidência anual de HIV superior a 2% garantiria a existência de amostras de tamanho viável para provas de eficácia de vacinas preventivas. Numa população com uma incidência de 2%, por exemplo, seria necessária uma amostra de aproximadamente 1600 voluntários (vacinados e grupo de controle), na hipótese de 70% de eficácia da vacina, com seguimento em um ano, visando uma potência de 80% e um nível de significância, com uma incidência de 10%, uma amostra de 300 pessoas [10]. Estudos realizados em certos países em desenvolvimento parecem indicar uma incidência anual de HIV de 2-3% entre grupos de gestantes [11], e de 5-10% entre grupos de prostitutas [12] [13]. Populações de países que hoje não são consideradas como possíveis grupos alvos para provas da Fase III, devido a uma incidência muito baixa de HIV, podem ser ainda importantes no futuro, especialmente se já for elevada a incidência de outras doenças sexualmente transmitidas (DST).
É necessário que existam nos possíveis locais das provas, laboratórios bem instalados e de confiança, com garantia de qualidade. Tais laboratórios devem estar em condições de processar e testar o número de amostras necessário para atender o tamanho estimado da amostra durante as fases de recrutamento e seguimento da prova. Os testes devem compreender as provas necessárias para identificar possíveis participantes, acompanhar possíveis efeitos colaterais de vacinas candidatas, avaliar respostas imunes induzidas pela vacina e analisar a progressão da doença. Uma vez que a metodologia para avaliação de respostas imunitárias pode ser extremamente complexa, não tendo sido ainda padronizada na maioria dos casos, e considerada a possibilidade de que certo número de amostras tenha que ser remetido a laboratórios internacionais de referência para análise mais aprofundada.
Há necessidade de instalações clínicas para o exame inicial de voluntários recrutados para provas da Fase I/II de todos os tipos de vacinas candidatas, a fim de excluir pessoas com possíveis contra-indicações médicas; e durante a prova, serão necessárias instalações clínicas para assegurar o seguimento clínico apropriado para detecção de efeitos colaterais. É também essencial a existência de instalações clínicas apropriadas para a avaliação da eficiência das provas de imunoterapia, em que é indispensável o diagnóstico preciso dos pontos finais clínicos.
A logística necessária para a realização de provas clínicas é o fator essencial do sucesso, sendo geralmente determinada pelo tamanho da população do estudo. Inclui a acessibilidade do local e as comunicações, os serviços públicos locais, a capacidade de processamento e análise de dados e a disponibilidade de pessoal de apoio. Ademais, é preciso que haja o empenho de manter os esforços de longo prazo, a nível nacional, com base no adequado apoio político e na participação da comunidade a nível local. A experiência passada com provas de campo similares terá fortalecido algumas dessas exigências logísticas.
A preparação dos locais para as provas de eficácia deve compreender treinamento, fortalecimento da infra-estrutura e realização de pesquisas preparatórias, devem-se incluir estudos epidemiológicos, caracterização antigênica de vírus, estudos sociais e de comportamento e provas piloto da metodologia de testagem da vacina. A pesquisa epidemiológica deve examinar a incidência de HIV em determinados grupos da população, assim como a sua mobilidade. Os estudos de comportamento devem examinar aspectos como os meios de motivar a participação na prova e/ou a observância do que ela exige, assim como maneiras de aconselhar e obter consentimento bem informado. As metodologias laboratoriais apropriadas para provas de campo, como os testes de triagem sorológica, os testes sorológicos específicos para a vacian e a padronização das técnicas de PCR devem ser avaliadas antes que a testagem tenha início.

Realização de Provas da Vacina


A foto mostra o vírus da AIDS, ampliado 360 mil vezes, e foi obtida por pesquisadores do Departamento Médico da Universidade de Tottori, na cidade de Yonago, Japão,
a partir de amostra do vírus cedida pelo Instituto Pasteur

Embora tenham ocorrido no último ano importantes avanços no desenvolvimento de vacinas contra o HIV, é difícil prever quando serão realizadas provas de eficácia de vacinas preventivas. Num quadro realista, poder-se-ia contar com a possibilidade de que, nos próximos dois a cinco anos, uma ou mais vacinas candidatas sejam consideradas para a prova de eficácia em grande escala em seres humanos. Seria possível considerar provas de imunoterapia ativa antes disso, podendo-se mesmo levá-las a cabo enquanto estivessem sendo preparadas as provas preventivas.
De modo geral, reconhece-se que a avaliação da eficácia de vacinas candidatas contra o HIV deve ser feita em provas controladas duplamente cegas, utilizando populações adultas apropriadas. As pessoas participantes na etapa de controle da prova devem ser também beneficiadas por ela, recebendo juntamente com o grupo envolvido no estudo, educação sanitária e acesso a preservativos para prevenção, bem como aconselhamento e garantia de acesso ao sistema geral de atenção à saúde. Os grupos de controle receberiam outras vacinas, como toxóide antitetênico para mulheres, ou placebos. Os controles históricos não oferecem uma verificação adequada para provas em grande escala da Fase III, em virtude das rápidas transformações que se observam na epidemiologia do HIV, e/ou do efeito do fortalecimento das intervenções preventivas sobre a incidência do vírus.
A eficácia do aconselhamento no tocante a meios de diminuir a transmissão de HIV deve ser avaliada durante as provas. Ainda que o aconselhamento reduza a incidência de infecções pelo HIV numa população envolvida nos testes, não seria realista esperar que fosse absolutamente eficaz, e o seu efeito deve ser levado em conta da maneira mais realística possível ao se estimar o tamanho da amostra necessária para as provas de eficácia. Por exemplo, um programa de intervenção realizado entre prostitutas de Kinshasa, com aconselhamento para a promoção do uso de preservativos e tratamento de DST, teria contribuído para um declínio da incidência anual de HIV, de 18% no inicio da intervenção para uma incidência anual de 2,2% nos três últimos meses do estudo [13].
Os pontos primários iniciais e os pontos finais para a avaliação de vacinas anti-HIV preventivas serão não a ocorrência de AIDS, mas a ocorrência de infecção, que pode, no caso de indivíduos imunizados contra o HIV, exigir técnicas especiais de laboratório. Ademais, com base em experiências com vacinas experimentais com o modelo do vírus do macaco/SIV [14], é possível que as vacinas preventivas possam não oferecer proteção contra a infecção pelo HIV, podendo, porém, impedir a progressão da doença em vacinados inicialmente soronegativos que vieram a ser posteriormente infectados. O acompanhamento das provas de vacinas da Fase III para detectar a prevenção da doença poderá exigir amostras de muitos milhares de pessoas e períodos de seguimento de muitos anos. Em tais casos, pontos finais simples, como a morte, reduziriam os requisitos logísticos e técnicos para uma prova prolongada. Assim, em todos os testes de eficácia, devem-se fazer, sempre que possível, previsões para o seguimento de longo prazo de soroconvertidos e para o uso quantitativo de marcadores de cargas víricas ou números de células CD4+, a fim de colher informações diagnósticas finais que possam ser úteis numa avaliação desse tipo.
Poder-se-ia fazer a testagem paralela de vacinas candidatas em indivíduos soronegativos e soropositivos. Caso uma vacina deixe de evitar a infecção de soronegativos, muito embora tenha algum efeito significativo sobre a progressão da doença em indivíduos soronegativos que vieram a ser infectados, muito embora se reconheça que não é fácil a extrapolação dos resultados.

Problemas Éticos, Sociais e Jurídicos [15]

Os princípios orientadores gerais sobre aspectos éticos a serem considerados na testagem internacional de vacinas candidatas contra o HIV devem conformar-se com a Declaração de Helsinque (revista pela Assembléia Médica Mundial, em Veneza, Itália, em outubro de 1988) e com a Proposta de Diretrizes Internacionais para Pesquisas Biomédicas com Sujeitos Humanos, elaborada em 1982 pela OMS e pelo Conselho das Organizações Internacionais de Ciências Médicas (COICM) [16]. A OMS e o COICM estão atualmente atualizando aquelas diretrizes e elaborando Normas Éticas Internacionais para Pesquisa Epidemiológica. Estão sendo também preparados pela OMS e pelo COICM uma lista de verificação de considerações éticas, jurídicas e práticas em pesquisas de que participam sujeitos humanos e um modelo de memorando de entendimento entre pesquisadores de países desenvolvidos e em desenvolvimento que colaboram entre si. Esses documentos proporcionariam entre aos Comitês Nacionais de Revisão Ética, orientação para supervisionar a condução de provas de vacinas e outras com sujeitos humanos.
As provas de vacinas contra a SIDA/AIDS diferem pronunciadamente de muitas outras provas clinicas, pelo fato de que podem resultar em discriminação social ou dano. Daí a necessidade de, em todas as etapas da testagem de vacinas, levar em igual consideração as conseqüências sociais negativas e os possíveis efeitos médicos adversos da vacina candidata. A discriminação social pode manifestar-se em várias etapas de uma prova, inclusive contra a pessoa que se dispõem voluntariamente a participar e subseqüentemente vem a acusar anticorpos positivos para o HIV ser condição essencial de qualquer prova a disponibilidade de testes confiáveis de laboratório para distinguir entre soroconversão resultante da imunização e soroconversão devido a infecção ativa, e assim também que a evidência nesse sentido seja aceita pelas autoridades competentes.
Será necessário enfrentar e resolver satisfatoriamente diversas questões jurídicas e regulamentares. O problema da responsabilidade perante terceiros deve ser discutido num contexto internacional, a fim de remover o que poderia constituir um desincentivo de monta ao aperfeiçoamento de vacinas contra o HIV. Sugeriu-se a instituição de um sistema de seguro contra riscos, financiado pelos cofres públicos, por recursos privados ou por fundos de ambas as origens [16].

Disponibilidade Global de Vacinas Contra o HIV

Uma vez aperfeiçoadas as vacinas seguras e eficazes, uma das grandes responsabilidades da OMS será assegurar a sua disponibilidade a todas as pessoas que possam estar em risco de infecção. Considera-se essencial que as vacinas desenvolvidas ou avaliadas mediante a colaboração científica internacional sejam postas à disposição dos países em desenvolvimento nas condições mais vantajosas possíveis. Está sendo considerada a possibilidade de entendimentos multipartites com a indústria farmacêutica, as entidades e os países doadores, as organizações não-governamentais, etc., os quais podem tornar-se necessários para fazer frente a esse desafio global.

Agradecimentos

Agradecemos as observações e sugestões dos Drs. A. Bjorkman, D. Heyman e M. Merson durante a preparação do manuscrito, assim como aos numerosos cientistas que proporcionaram à OMS a sua experiência e o seu conselho durante o desenvolvimento da estratégia e o desempenho das atividades descritas neste trabalho.

Do Programa Mundial de AIDS, Organização Mundial de Saúde, Genebra, Suíça, e do *Instituto Karolinska, Estocolmo, Suécia.

Nota: O Dr. Wigzell é Presidente do Comitê Coordenador do Aperfeiçoamento de Vacinas do Programa Mundial de AIDS (PMA) da Organização Mundial de Saúde (OMS). São integrantes do Comitê os Drs. N. Bhamrapravati (Tailândia), D. Bolognesi (EUA), D. Burke (EUA), B. Galvão-Castro (Brasil), M. Girard (França), W. Koff (EUA), F. Mahlu (republica Unida da Tanzânia), S. Mboup (Senegal) e G. Schild (Reino Unido).


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