José Esparza, Saladin Osmanov,
Lars O. Kallings e Wigzell - Sociólogo e presidente da ABIA
- Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS
A Perspectiva da OMS
Introdução
Tem sido apenas parcial o sucesso de diversas estratégias de
intervenção para conter a propagação da epidemia
de HIV/AIDS, no que se refere à redução do comportamento
de risco. Apesar dos intensos esforços nacionais e internacionais,
estima-se em 10 milhões de adultos e um milhão de crianças
o total de pessoas infectadas pelo vírus em todo mundo [1]. A prevalência
de HIV continua crescendo em todo o mundo. Segundo projeção
da Organização Mundial de Saúde (OMS), haverá
até o ano 2000, um total acumulado de 40 milhões de infecções
por HIV entre homens, mulheres e crianças, e mais de 90% dessas
infecções terão ocorrido em países em desenvolvimento
e mais de 80% dessas terão sido a conseqüência de contato
heterossexual [2].
A disponibilidade de uma vacina segura eficaz contra HIV seria de enorme
valia para complementar outras intervenções de prevenção
e para atingir populações que poderiam não ser facilmente
acessíveis àquelas intervenções. Diversas
vacinas candidatas estão sendo atualmente submetidas às
primeiras provas clínicas humanas e muitas outras estão
sendo desenvolvidas no laboratório [3]. Essas primeiras provas
clínicas (por vezes denominadas provas da Fase I/II) estão
proporcionando valiosas informações sobre a segurança
e imunogenicidade das vacinas candidatas, assim como dos aspectos logísticos
e práticos da testagem de vacinas contra o HIV [4]. Algumas dessas
vacinas candidatas podem no futuro passar às provas da Fase III,
que se destinam a avaliar a sua eficiência na proteção
contra a infecção pelo HIV.
Embora a meta final do desenvolvimento da vacina contra o HIV seja a disponibilidade
de vacina preventiva segura e eficaz para proteger indivíduos sadios
soronegativos contra a infecção e/ou a doença, é
também reconhecido o fato de que existem outros possíveis
usos: como agente terapêutico (imunoterapia ativa) em indivíduos
soropositivos, ou como vacina perinatal para impedir a transmissão
do vírus de mãe infectada por HIV ao recém-nascido.
Neste caso, a vacina poderia servir também de agente terapêutico
na mãe, evitando ao mesmo tempo a infecção do feto.
Do ponto de vista da saúde pública, uma vacina capaz de
impedir a infecção pelo HIV é uma meta altamente
desejável, pelo fato de que teria um efeito multiplicador a corrente
de transmissão do vírus.
A complexidade dos futuros testes de eficácia da vacina anti-HIV
é esmagadora. Terá sido necessário avaliar diversas
vacinas candidatas, em países tanto desenvolvidos como em desenvolvimento,
e os períodos de avaliação durarão muitos
anos. Ademais, o aperfeiçoamento de vacinas contra o HIV será
um processo contínuo. Ainda que a segurança e a eficácia
de algumas vacinas candidatas iniciais seja demonstrada mediante provas
nos próximos anos, é possível que os produtos não
se prestem para uso em todas as partes do mundo. Muito provavelmente,
o desenvolvimento de vacinas far-se-á em etapas sucessivas, devido
a melhoramentos das formulações iniciais e ao desenvolvimento
de novos vetores e/ou adjuvantes, o que, além de dar margem a uma
eficácia maior, resultará também no decréscimo
do número de doses necessárias, ampliando, segundo se espera,
a extensão da proteção para um número maior
de sujeitos e, com toda certeza, diminuindo o custo das vacinas.
O aperfeiçoamento e avaliação de vacinas candidatas
contra o HIV colocam no tapete diversos desafios científicos, éticos,
jurídicos e sociais, especialmente se as provas forem levadas a
cabo em outros países que não aqueles que estão sendo
desenvolvidas, isto é, num contexto internacional [5]. Para enfrentar
esse desafio global, se faz necessária uma intensa colaboração
internacional a longo prazo entre países, programas nacionais de
desenvolvimento de vacinas anti-HIV, a indústria farmacêutica
e biotecnológica e os organismos doadores, que eventualmente estarão
envolvidos na provisão de vacinas aos países necessitados.
A Estratégia da OMS para Desenvolvimento de Vacinas Anti-HIV
A OMS recebeu o mandato de dirigir e coordenar a urgente luta global
contra a SIDA/AIDS. Assessorada pelo recém-criado Comitê
Coordenador do Aperfeiçoamento de Vacinas, o Programa Mundial de
AIDS (PMA) da OMS formulou uma estratégia geral para a elaboração
de vacinas contra o HIV. Essa estratégia tem três aspectos
principais: desenvolvimento, avaliação e disponibilidade.
As metas da estratégia até o fim da fase de desenvolvimento
são: facilitar a colaboração internacional na pesquisa
de vacinas, promover o aperfeiçoamento de vacinas apropriadas para
uso em países em desenvolvimento e proporcionar mecanismos para
identificar as vacinas candidatas que mereçam avaliação
num contexto internacional. Durante a etapa de avaliação
as metas são: identificar, avaliar e assegurar o fortalecimento
dos possíveis locais de avaliação de vacinas em países
em desenvolvimento, promover e apoiar a realização de provas
de campo científica e eticamente bem fundamentadas (Fases I, II
e III) de vacinas candidatas e assegurar a análise e avaliação
adequadas dos resultados dessas provas. Até a fase de disponibilidade,
e em preparação para o momento em que se disponha de vacinas
seguras e eficazes, as metas serão concernentes à acessibilidade
econômica e à distribuição, particularmente
em países em desenvolvimento, e incluem estratégias para
identificação de possíveis grupos alvos e mecanismos
para fornecimento futuro de vacinas.
Tais atividades estão sendo levadas a cabo em estreito entrosamento
com outros esforços nacionais e internacionais para o aperfeiçoamento
de vacinas anti-HIV, inclusive os da indústria farmacêutica/biotecnológica
[6].
Desenvolvimento e Identificação de Vacinas Candidatas
Apropriadas para Testagem Internacional
Para que possam desempenhar papel significativo no controle futuro da
epidemia de AIDS, é preciso que as vacinas sejam apropriadas para
uso em populações com alto risco de infecção,
em países tanto industrializados como em desenvolvimento. As vacinas
preventivas devem ser antigenicamente apropriadas para dar proteção
contra a infecção pelo HIV em todas as áreas geográficas
do mundo e ser fáceis de administrar. Devem conferir imunidade
duradoura contra vírus em estado livre e associados a células,
com um número mínimo de doses; e devem ser termoestáveis.
Devem impedir a transmissão por qualquer via, inclusive o sangue
e a transmissão sexual, esta última, talvez, pela indução
de imunidade tanto sistêmica como ao nível de mucosa. Neste
particular, perde-se-ia explorar mais intensivamente a possibilidade de
vacinas orais capazes de produzir imunidade ao nível da mucosa.
O conhecimento detalhado das características genéticas e
antigenéticas das cepas de HIV prevalentes em diferentes áreas
geográficas pode ser essencial para a compreensão da epidemiologia
da infecção por ele causada e deve proporcionar uma base
essencial para o enfoque racional do aperfeiçoamento de vacinas
[7]. Para assegurar esse conhecimento, a OMS criou uma Rede [Mundial]
para Isolamento e Caracterização do HIV, destinada a assegurar
a disponibilidade de cepas apropriadas de vacinas precedentes de locais
selecionados. A Rede está preparando protocolos padronizados para
coleta, isolamento e caracterização básica de cepas
de HIV [8], e cepas obtidas pela Rede da OMS serão postas gratuitamente
à disposição de cientistas, pesquisadores e fabricantes
de vacinas.
O Comitê Coordenador do Desenvolvimento de Vacinas da OMS/PMA está
identificado critérios para admissão de vacinas candidatas
a provas clínicas, especialmente em casos nos quais devem ser testadas
em países em desenvolvimento. Diretrizes descrevendo esses critérios
serão distribuídas aos países, estimulando-os a buscar
o endosso da OMS para todos os testes de vacinas contra a AIDS. É
recomendada também uma interação dos pesquisadores
de vacinas com a OMS desde as etapas iniciais do processo de planejamento,
assim como a apresentação de seus protocolos para revisão
e apoio do Comitê Coordenador. A OMS prontificou-se a servir como
facilitadora, a fim de assegurar a rápida implementação
de estudos cientifica e eticamente aceitáveis de vacinas e está
formando um mecanismo para a revisão dos protocolos de vacinas
candidatas, inclusive as que são testadas em países em desenvolvimento.
A OMS acompanha constantemente o progresso das vacinas em todo o mundo,
a fim de poder recomendar a formulação dos estudos mais
apropriados, com base na experiência adquirida com as etapas anteriores.
Esse processo é estritamente confidencial e destina-se a possibilitar
uma rápida tramitação dos conselhos, das recomendações
e do endosso do Comitê Coordenador OMS/PMA para Desenvolvimento
de Vacinas.
Os critérios para aceitação de uma vacina candidata
podem variar, dependendo da finalidade da vacina candidata, seja esta
preventiva, terapêutica ou perinatal. Nas diretrizes que estão
sendo formuladas pelo Comitê de Coordenação, os seguintes
aspectos gerais são considerados: a) fundamento racional da busca
de proteção ou tratamento para a população
ou tratamento para a população a ser estudada, inclusive
a compatibilidade antigênica entre as cepas de HIV incluídas
nas vacinas e as em circulação na população
do estudo; b) avaliação prévia ou paralela de uma
vacina comparável (ou seja, a mesma proteína de uma cepa
diferente de HIV) no país de origem; e c) avaliação
independente do controle de qualidade das vacinas pelas autoridades fiscalizadoras
apropriadas no país de origem.
Preparação de Locais para Avaliação
de Vacinas Contra o HIV
É amplamente reconhecido o fato de que poderia haver necessidade
de muitos diferentes estudos da Fase I/II de vacinas candidatas contra
o HIV para compreender importantes variáveis do aperfeiçoamento
de vacinas, como, por exemplo os tipos de imunizantes e a melhor maneira
de apresenta-los, e os correlatos imunes da proteção em
relação a estudos em modelos animais. É também
geralmente sabido que tais pesquisas, via de regra, devem ser feitas no
país de origem da vacina candidata. As provas em grande escala
da eficácia de vacinas candidatas cuidadosamente selecionadas (Fase
III) devem ser, contudo, mais limitadas, realizando-se em populações
com alta incidência de infecções pelo HIV, em países
tanto desenvolvidos como em desenvolvimento.
É possível que determinada vacina candidata ofereça
diferentes graus de proteção, conforme seja a população
na qual é testada, dadas as diferenças quanto à via,
aos padrões e à freqüência da transmissão.
Assim, pode ser necessário testar dada vacina candidata em diferentes
populações.
É geralmente reconhecida a necessidade de que os testes de segurança
e imunogenicidade (Fase I/II) das vacinas candidatas testadas no país
de origem sejam repetidos ou efetuados em forma paralela em países
onde serão realizadas provas de eficácia, pelo fato de que
as diferenças na resposta imunitária e nos efeitos colaterais
podem variar devido a fatores tais como nutrição, infecções
inaparentes e/ou diferenças genéticas na resposta imunitária.
As provas repetidas ou paralelas da Fase I/II em países em desenvolvimento
contribuirão também para o treinamento e o fortalecimento
institucional, razão pala qual podem os cientistas daqueles países
ter plena participação no processo científico de
aperfeiçoamento de vacinas contra o HIV.
A OMS identificou possíveis locais para testes de eficácia
de vacinas candidatas contra o HIV (preventivas, terapêuticas e/ou
perinatais). Países da África, da América Latina
e do Caribe foram visitados por equipes da OMS/PMA para avaliar o seu
potencial para a testagem de vacinas contra o HIV. Os primeiros locais
de prova foram selecionados pelo Comitê Coordenador do Desenvolvimento
de Vacinas da OMS/PMA em setembro de 1991. Os critérios para seleção
daqueles países compreenderam considerações epidemiológicas,
laboratoriais, clínicas e operativas, que foram identificadas numa
consulta da OMS em novembro de 1990 [9].
Os possíveis grupos alvo de população para provas
de vacinas preventivas contra o HIV são aqueles nos quais se observa
alta incidência de HIV e baixo potencial de desistência. Uma
incidência anual de HIV superior a 2% garantiria a existência
de amostras de tamanho viável para provas de eficácia de
vacinas preventivas. Numa população com uma incidência
de 2%, por exemplo, seria necessária uma amostra de aproximadamente
1600 voluntários (vacinados e grupo de controle), na hipótese
de 70% de eficácia da vacina, com seguimento em um ano, visando
uma potência de 80% e um nível de significância, com
uma incidência de 10%, uma amostra de 300 pessoas [10]. Estudos
realizados em certos países em desenvolvimento parecem indicar
uma incidência anual de HIV de 2-3% entre grupos de gestantes [11],
e de 5-10% entre grupos de prostitutas [12] [13]. Populações
de países que hoje não são consideradas como possíveis
grupos alvos para provas da Fase III, devido a uma incidência muito
baixa de HIV, podem ser ainda importantes no futuro, especialmente se
já for elevada a incidência de outras doenças sexualmente
transmitidas (DST).
É necessário que existam nos possíveis locais das
provas, laboratórios bem instalados e de confiança, com
garantia de qualidade. Tais laboratórios devem estar em condições
de processar e testar o número de amostras necessário para
atender o tamanho estimado da amostra durante as fases de recrutamento
e seguimento da prova. Os testes devem compreender as provas necessárias
para identificar possíveis participantes, acompanhar possíveis
efeitos colaterais de vacinas candidatas, avaliar respostas imunes induzidas
pela vacina e analisar a progressão da doença. Uma vez que
a metodologia para avaliação de respostas imunitárias
pode ser extremamente complexa, não tendo sido ainda padronizada
na maioria dos casos, e considerada a possibilidade de que certo número
de amostras tenha que ser remetido a laboratórios internacionais
de referência para análise mais aprofundada.
Há necessidade de instalações clínicas para
o exame inicial de voluntários recrutados para provas da Fase I/II
de todos os tipos de vacinas candidatas, a fim de excluir pessoas com
possíveis contra-indicações médicas; e durante
a prova, serão necessárias instalações clínicas
para assegurar o seguimento clínico apropriado para detecção
de efeitos colaterais. É também essencial a existência
de instalações clínicas apropriadas para a avaliação
da eficiência das provas de imunoterapia, em que é indispensável
o diagnóstico preciso dos pontos finais clínicos.
A logística necessária para a realização de
provas clínicas é o fator essencial do sucesso, sendo geralmente
determinada pelo tamanho da população do estudo. Inclui
a acessibilidade do local e as comunicações, os serviços
públicos locais, a capacidade de processamento e análise
de dados e a disponibilidade de pessoal de apoio. Ademais, é preciso
que haja o empenho de manter os esforços de longo prazo, a nível
nacional, com base no adequado apoio político e na participação
da comunidade a nível local. A experiência passada com provas
de campo similares terá fortalecido algumas dessas exigências
logísticas.
A preparação dos locais para as provas de eficácia
deve compreender treinamento, fortalecimento da infra-estrutura e realização
de pesquisas preparatórias, devem-se incluir estudos epidemiológicos,
caracterização antigênica de vírus, estudos
sociais e de comportamento e provas piloto da metodologia de testagem
da vacina. A pesquisa epidemiológica deve examinar a incidência
de HIV em determinados grupos da população, assim como a
sua mobilidade. Os estudos de comportamento devem examinar aspectos como
os meios de motivar a participação na prova e/ou a observância
do que ela exige, assim como maneiras de aconselhar e obter consentimento
bem informado. As metodologias laboratoriais apropriadas para provas de
campo, como os testes de triagem sorológica, os testes sorológicos
específicos para a vacian e a padronização das técnicas
de PCR devem ser avaliadas antes que a testagem tenha início.
Realização de Provas da Vacina

A foto mostra o vírus da AIDS, ampliado
360 mil vezes, e foi obtida por pesquisadores do Departamento Médico
da Universidade de Tottori, na cidade de Yonago, Japão,
a partir de amostra do vírus cedida pelo Instituto Pasteur |
Embora tenham ocorrido no último ano importantes avanços
no desenvolvimento de vacinas contra o HIV, é difícil prever
quando serão realizadas provas de eficácia de vacinas preventivas.
Num quadro realista, poder-se-ia contar com a possibilidade de que, nos
próximos dois a cinco anos, uma ou mais vacinas candidatas sejam
consideradas para a prova de eficácia em grande escala em seres
humanos. Seria possível considerar provas de imunoterapia ativa
antes disso, podendo-se mesmo levá-las a cabo enquanto estivessem
sendo preparadas as provas preventivas.
De modo geral, reconhece-se que a avaliação da eficácia
de vacinas candidatas contra o HIV deve ser feita em provas controladas
duplamente cegas, utilizando populações adultas apropriadas.
As pessoas participantes na etapa de controle da prova devem ser também
beneficiadas por ela, recebendo juntamente com o grupo envolvido no estudo,
educação sanitária e acesso a preservativos para
prevenção, bem como aconselhamento e garantia de acesso
ao sistema geral de atenção à saúde. Os grupos
de controle receberiam outras vacinas, como toxóide antitetênico
para mulheres, ou placebos. Os controles históricos não
oferecem uma verificação adequada para provas em grande
escala da Fase III, em virtude das rápidas transformações
que se observam na epidemiologia do HIV, e/ou do efeito do fortalecimento
das intervenções preventivas sobre a incidência do
vírus.
A eficácia do aconselhamento no tocante a meios de diminuir a transmissão
de HIV deve ser avaliada durante as provas. Ainda que o aconselhamento
reduza a incidência de infecções pelo HIV numa população
envolvida nos testes, não seria realista esperar que fosse absolutamente
eficaz, e o seu efeito deve ser levado em conta da maneira mais realística
possível ao se estimar o tamanho da amostra necessária para
as provas de eficácia. Por exemplo, um programa de intervenção
realizado entre prostitutas de Kinshasa, com aconselhamento para a promoção
do uso de preservativos e tratamento de DST, teria contribuído
para um declínio da incidência anual de HIV, de 18% no inicio
da intervenção para uma incidência anual de 2,2% nos
três últimos meses do estudo [13].
Os pontos primários iniciais e os pontos finais para a avaliação
de vacinas anti-HIV preventivas serão não a ocorrência
de AIDS, mas a ocorrência de infecção, que pode, no
caso de indivíduos imunizados contra o HIV, exigir técnicas
especiais de laboratório. Ademais, com base em experiências
com vacinas experimentais com o modelo do vírus do macaco/SIV [14],
é possível que as vacinas preventivas possam não
oferecer proteção contra a infecção pelo HIV,
podendo, porém, impedir a progressão da doença em
vacinados inicialmente soronegativos que vieram a ser posteriormente infectados.
O acompanhamento das provas de vacinas da Fase III para detectar a prevenção
da doença poderá exigir amostras de muitos milhares de pessoas
e períodos de seguimento de muitos anos. Em tais casos, pontos
finais simples, como a morte, reduziriam os requisitos logísticos
e técnicos para uma prova prolongada. Assim, em todos os testes
de eficácia, devem-se fazer, sempre que possível, previsões
para o seguimento de longo prazo de soroconvertidos e para o uso quantitativo
de marcadores de cargas víricas ou números de células
CD4+, a fim de colher informações diagnósticas finais
que possam ser úteis numa avaliação desse tipo.
Poder-se-ia fazer a testagem paralela de vacinas candidatas em indivíduos
soronegativos e soropositivos. Caso uma vacina deixe de evitar a infecção
de soronegativos, muito embora tenha algum efeito significativo sobre
a progressão da doença em indivíduos soronegativos
que vieram a ser infectados, muito embora se reconheça que não
é fácil a extrapolação dos resultados.
Problemas Éticos, Sociais e Jurídicos [15]
Os princípios orientadores gerais sobre aspectos éticos
a serem considerados na testagem internacional de vacinas candidatas contra
o HIV devem conformar-se com a Declaração de Helsinque (revista
pela Assembléia Médica Mundial, em Veneza, Itália,
em outubro de 1988) e com a Proposta de Diretrizes Internacionais para
Pesquisas Biomédicas com Sujeitos Humanos, elaborada em 1982 pela
OMS e pelo Conselho das Organizações Internacionais de Ciências
Médicas (COICM) [16]. A OMS e o COICM estão atualmente atualizando
aquelas diretrizes e elaborando Normas Éticas Internacionais para
Pesquisa Epidemiológica. Estão sendo também preparados
pela OMS e pelo COICM uma lista de verificação de considerações
éticas, jurídicas e práticas em pesquisas de que
participam sujeitos humanos e um modelo de memorando de entendimento entre
pesquisadores de países desenvolvidos e em desenvolvimento que
colaboram entre si. Esses documentos proporcionariam entre aos Comitês
Nacionais de Revisão Ética, orientação para
supervisionar a condução de provas de vacinas e outras com
sujeitos humanos.
As provas de vacinas contra a SIDA/AIDS diferem pronunciadamente de muitas
outras provas clinicas, pelo fato de que podem resultar em discriminação
social ou dano. Daí a necessidade de, em todas as etapas da testagem
de vacinas, levar em igual consideração as conseqüências
sociais negativas e os possíveis efeitos médicos adversos
da vacina candidata. A discriminação social pode manifestar-se
em várias etapas de uma prova, inclusive contra a pessoa que se
dispõem voluntariamente a participar e subseqüentemente vem
a acusar anticorpos positivos para o HIV ser condição essencial
de qualquer prova a disponibilidade de testes confiáveis de laboratório
para distinguir entre soroconversão resultante da imunização
e soroconversão devido a infecção ativa, e assim
também que a evidência nesse sentido seja aceita pelas autoridades
competentes.
Será necessário enfrentar e resolver satisfatoriamente diversas
questões jurídicas e regulamentares. O problema da responsabilidade
perante terceiros deve ser discutido num contexto internacional, a fim
de remover o que poderia constituir um desincentivo de monta ao aperfeiçoamento
de vacinas contra o HIV. Sugeriu-se a instituição de um
sistema de seguro contra riscos, financiado pelos cofres públicos,
por recursos privados ou por fundos de ambas as origens [16].
Disponibilidade Global de Vacinas Contra o HIV
Uma vez aperfeiçoadas as vacinas seguras e eficazes, uma das
grandes responsabilidades da OMS será assegurar a sua disponibilidade
a todas as pessoas que possam estar em risco de infecção.
Considera-se essencial que as vacinas desenvolvidas ou avaliadas mediante
a colaboração científica internacional sejam postas
à disposição dos países em desenvolvimento
nas condições mais vantajosas possíveis. Está
sendo considerada a possibilidade de entendimentos multipartites com a
indústria farmacêutica, as entidades e os países doadores,
as organizações não-governamentais, etc., os quais
podem tornar-se necessários para fazer frente a esse desafio global.
Agradecimentos
Agradecemos as observações e sugestões dos Drs.
A. Bjorkman, D. Heyman e M. Merson durante a preparação
do manuscrito, assim como aos numerosos cientistas que proporcionaram
à OMS a sua experiência e o seu conselho durante o desenvolvimento
da estratégia e o desempenho das atividades descritas neste trabalho.
Do Programa Mundial de AIDS, Organização
Mundial de Saúde, Genebra, Suíça, e do *Instituto
Karolinska, Estocolmo, Suécia.
Nota: O Dr. Wigzell é Presidente do
Comitê Coordenador do Aperfeiçoamento de Vacinas do Programa
Mundial de AIDS (PMA) da Organização Mundial de Saúde
(OMS). São integrantes do Comitê os Drs. N. Bhamrapravati
(Tailândia), D. Bolognesi (EUA), D. Burke (EUA), B. Galvão-Castro
(Brasil), M. Girard (França), W. Koff (EUA), F. Mahlu (republica
Unida da Tanzânia), S. Mboup (Senegal) e G. Schild (Reino Unido).
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